sexta-feira, 27 de maio de 2011

Efeitos da Fisioterapia Respiratória Convencional versus aumento do fluxo expiratório na saturação de O2, frequência cardíaca, frequência respiratória em prematuros no período pós-extubação

INTRODUÇÃO
Devido à imaturidade do sistema respiratório, os recém-nascidos (RN) prematuros apresentam altos riscos de desenvolver complicações respiratórias com necessidade de ventilação pulmonar mecânica, assim, a possibilidade de fisioterapia respiratória torna-se cada vez mais necessária em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal1.
A técnica de higiene brônquica é descrita tradicionalmente na literatura como fisioterapia respiratória convencional (FRC) e compreende as manobras de drenagem postural, pressão manual torácica, facilitação da tosse e/ou aspiração de vias aéreas superiores2.

O aumento do fluxo expiratório (AFE) é uma técnica não convencional de desobstrução brônquica que pode ser aplicada desde o nascimento, inclusive no RN prematuro, quando existe doença respiratória com obstrução das vias aéreas3. A desobstrução é realizada por meio de preensão bimanual, com uma mão envolvendo e comprimindo suavemente a parede anterolateral do tórax do RN durante a expiração, enquanto a outra mão exerce apoio estático no abdome4.
O AFE é definido como aumento ativo, ativo-assistido, ou passivo do volume expirado, em velocidade ou quantidade. Dentre as técnicas fisioterapêuticas o AFE é uma das mais utilizadas em pediatria, tendo como objetivo mobilizar, deslocar e eliminar as secreções traqueobrônquicas5, 6.
Em RN prematuros não existem estudos comparativos das técnicas convencionais e técnicas a fluxo, embora ambas sejam usadas rotineiramente em UTI Neonatal.
Considerando a importância da assistência fisioterapêutica nos cuidados ao prematuro e a escassez de estudos sobre o tema, este estudo teve como objetivo: comparar os efeitos da FRC versus AFE na saturação de O2 (SpO2), freqüência cardíaca (FC) e freqüência respiratória (FR) de recém-nascidos prematuros, nas primeiras 48 horas pós-extubação.

MÉTODO
Estudo prospectivo e randomizado, envolvendo recém-nascidos prematuros internados na UTI Neonatal do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu-UNESP, no período de janeiro a março de 2004. O estudo foi realizado após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (541/2003).
Foram considerados prematuros os RN com idade gestacional inferior a 37 semanas, conforme critério da Organização Mundial de Saúde, e classificados como prematuros extremos aqueles com idade gestacional inferior a 31 semanas. A idade gestacional foi calculada preferencialmente pela data da última menstruação, desde que houvesse certeza ou pelo ultra-som obstétrico realizado até 20 semanas de gestação. Quando não disponíveis estas informações utilizou-se o método de New Ballard para estimar a idade gestacional7.
Critérios de inclusão
- idade gestacional menor que 37 semanas e idade pós-natal inferior a 30 dias;
- uso de FiOmenor ou igual a 0,4;
- ausência de má-formação congênita;
- respiração espontânea, nas primeiras 48 horas pós-extubação;
- solicitação médica para fisioterapia respiratória;
- consentimento materno livre e esclarecido para a participação na pesquisa.
O estudo foi delineado na forma de intenção de tratamento, tendo como critério de suspensão da manobra fisioterapêutica a diminuição da SpO2 para valores inferiores a 90%.

Procedimento
Após a solicitação médica de fisioterapia respiratória, a pesquisadora avaliava se o recém-nascido preenchia os critérios de inclusão; caso o paciente não fosse incluído procedia-se o atendimento fisioterapêutico conforme a rotina do serviço. Quando o recém-nascido preenchia os critérios de inclusão, a seqüência era: solicitar o consentimento materno e proceder a randomização.
Para a randomização foram confeccionados 20 cartões com a palavra FRC e 20 cartões com a palavra AFE, colocados individualmente em envelopes lacrados. O sorteio foi realizado pelo médico responsável pelo paciente e apenas a pesquisadora principal, responsável pela aplicação das técnicas conheciao conteúdo do cartão. Outra pesquisadora mensurava as variáveis nos três momentos de avaliação; assim este estudo pode ser considerado cego.
Após a randomização os recém-nascidos foram avaliados quanto à ausculta pulmonar, expansibilidade torácica, padrão respiratório, oximetria de pulso e padrão radiológico.
Foram obtidos dos prontuários e anotados em protocolo específico para pesquisa, os seguintes dados dos recém-nascidos: peso de nascimento, idade gestacional, tipo de parto, doenças, idade no início da fisioterapia.
Os recém-nascidos do Grupo FRC, receberam a drenagem postural e a tapotagem posicionados em decúbito lateral direito e esquerdo com duração de cinco minutos em cada lado. Na posição supina foram submetidos à vibrocompressão por mais cinco minutos, e ao término, para a eliminação de secreções, procedeu-se a aspiração de boca e narinas por um período de aproximadamente cinco minutos ou até que não houvesse mais secreções.
Os recém-nascidos do Grupo AFE, receberam a técnica AFE lento, na posição supina por 15 minutos, com o seguinte posicionamento das mãos do terapeuta: uma das mãos nas costelas inferiores e a outra utilizando a borda cubital na linha supramamária com compressão suave do tórax. No final da técnica os recém-nascidos foram aspirados com utilização de sonda e luvas estéreis, por um período de aproximadamente cinco minutos.

Nos dois grupos de estudo foram aferidas e anotadas a SpO2, freqüência cardíaca e freqüência respiratória, durante cinco minutos antes do início da técnica, após 10 minutos e após 30 minutos da aplicação das técnicas. Durante todo o procedimento os RNs foram continuamente monitorados com monitor multiparamétrico marca Dixtal® para observar qualquer dessaturação, taquicardia ou bradicardia, o que indicaria suspensão da técnica. Os RN estudados foram acompanhados até a alta da UTI, porém neste estudo foram utilizados os dados dos três primeiros dias de realização da fisioterapia. A assistência fisioterapêutica foi realizada duas vezes ao dia, uma no período da manhã e outra no período da tarde, com duração média de 20 minutos cada sessão.
Momentos de avaliação
M0= 5 minutos antes das manobras.
M1= 10 minutos após as manobras.
M2= 30 minutos após as manobras.
Variáveis de estudo
FC= aferida com estetoscópio durante um minuto.
FR= aferida com observação do movimento torácico em um minuto.
SpO2= aferida com oxímetro de pulso.
Análise estatística
As variáveis contínuas que tiveram distribuição normal foram analisadas pelo teste t Student, considerando-se a distribuição bi-caudal. As variáveis que não tiveram distribuição normal, foram comparadas pelo teste não paramétrico de Mann-Whitney. Para as variáveis categóricas foi utilizado o teste do Qui-quadrado ou exato de Fisher. Em todos os testes adotou-se o nível de significância em 5%.

RESULTADOS
Participaram do estudo 40 recém-nascidos prematuros, distribuídos em dois grupos: 20 no grupo FRC e 20 no grupo AFE.
Nenhum RN apresentou efeito adverso com as manobras e assim não houve exclusão do estudo.
A amostra foi constituída predominantemente por pequenos prematuros, sendo 67,5% deles com idade gestacional inferior a 31 semanas e 90% com peso ao nascimento menor que 1500g, sendo 14 do sexo feminino no Grupo FRC e apenas seis no Grupo AFE. A média do peso de nascimento no Grupo FRC foi de 1133 ± 375g. e no Grupo AFE foi de 1105 ± 337g., sem diferença entre os grupos (p = 0,805).
As principais características e diagnósticos dos RN encontram-se na Tabela 1. AsFiguras 12 e 3 apresentam os valores de SpO2, freqüência cardíaca e freqüência respiratória nos Grupos FRC e AFE nos três momentos de avaliação.

Em ambos os grupos houve aumento significativo da SpOaos 10 e 30 minutos após as manobras. A freqüência cardíaca aumentou após a FRC e não houve alteração significativa na freqüência respiratória.

DISCUSSÃO
Os avanços tecnológicos aumentaram a sobrevida de RN de alto risco, com pesos de nascimento e idades gestacionais cada vez menores, os quais evoluem com elevada morbidade neonatal requerendo assistência multiprofissional. Assim a fisioterapia tem adquirido papel de destaque em várias situações, dentre elas o relaxamento muscular, posicionamento, manutenção de boa postura, promoção da auto-organização e o auxílio na ventilação pulmonar do neonato8.
As características da casuística deste estudo foram homogêneas nos dois grupos e enquadram-se perfeitamente no perfil esperado da clientela de uma UTI neonatal de um hospital de nível terciário, ou seja, prematuros com idade gestacional e peso ao nascimento muito baixo, o que é importante, pois estes RN apresentam elevada morbidade neonatal e grandes limitações em sua função respiratória9. Coerente com estas características dos RN a SDR foi a doença inicial mais freqüente nesta amostra10, entretanto o início da fisioterapia na segunda semana de vida sugere que a indicação desta assistência não foi a SDR, e sim suas complicações, destacando-se como uma das mais freqüentes em nosso meio a infecção, que é sempre uma preocupação em pacientes submetidos à ventilação mecânica11.
No presente estudo, tanto a FRC como o AFE aumentaram significativamente a SpO2 nos dois momentos de avaliação (10 minutos e 30 minutos após as manobras), mostrando que, a curto prazo, estas técnicas são benéficas para a oxigenação. Porém há que se considerar que os RN avaliados já apresentavam SpO2 em níveis adequados antes da fisioterapia.

Resultado semelhante foi descrito por Finner et al.12, que com o uso da FRC em 20 recém-nascidos de termo e de pré-termo, obtiveram em 15 minutos após a fisioterapia, aumento significativo de 14,5mm Hg na PaO2. Entretanto, não há unanimidade quanto aos benefícios da fisioterapia respiratória em recém-nascidos, pois Fox et al.13 e Poleart et al.14 mostraram redução significativa da PaO2 após a FRC. Em relação ao efeito do AFE na oxigenação de recém-nascidos, não encontramos relatos na literatura que permitam confrontar nossos resultados.
Quanto à freqüência cardíaca os valores médios dos prematuros aqui estudados foram normais em todos os momentos de avaliação, entretanto após a FRC houve aumento significativo da FC que persistiu até 30 minutos, o que não ocorreu após o AFE sugerindo que esta manobra (AFE) seja menos estressante ao RN. Há de se considerar que qualquer doença causa estresse e pacientes de UTI são submetidos freqüentemente a vários fatores e situações de estresse físico e psicológico, tais como: imobilização, privação ou sobrecarga sensorial, desorientação, manipulação excessiva e principalmente dor15. Neste contexto o AFE pode ser considerado melhor que a FRC.
Os efeitos da fisioterapia respiratória na freqüência cardíaca são pouco referidos na literatura. Em estudo com pacientes adultos gravemente doentes documentou-se ocorrência de arritmias durante a FRC16.Enquanto que,recente estudo experimental, com ovelhas adultas mostrou que a técnica convencional de fisioterapia respiratória não apresentou efeitos hemodinâmicos adversos, pois sua aplicação não causou alteração na freqüência cardíaca, na pressão arterial e nas pressões de artéria pulmonar e átrio direito17. Em recém-nascidos prematuros com ventilação mecânica, Antunes et al.18 não observaram alteração na freqüência cardíaca em função do posicionamento em supino ou prono. Vivian-Beresford et al.19 relataram tendência a bradicardia com a aplicação da FRC em prematuros no período pré-extubação. Em recém-nascidos com respiração espontânea em fase de recuperação de doença respiratória, Fox et al.13 relataram a ocorrência de bradicardia transitória em alguns pacientes com a aplicação da fisioterapia convencional.

Tanto a FRC como o AFE não causou alterações significantes na freqüência respiratória que se manteve com valores normais durante todo o período de estudo, o que se justifica pelo fato dos RN estudados serem prematuros estáveis, em respiração espontânea com mínima necessidade de oxigênio e sem doença respiratória aguda. Resultados diferentes foram obtidos por Fox et al.13, que ao estudar as alterações fisiológicas e respiratórias associadas à fisioterapia respiratória documentaram aumento significativo da freqüência respiratória após a FRC.
Quanto aos efeitos cardiorrespiratórios do AFE, não dispomos de estudos em recém-nascidos. Entretanto, em crianças esta técnica foi avaliada em estudo nacional, não controlado, que mostrou, em 94 crianças com idade média de dois anos e diagnóstico de pneumonia, aumento significativo na freqüência respiratória e freqüência cardíaca, com normalização em 20 minutos. A saturação de O2também apresentou aumento significativo após a aplicação da técnica e manteve-se elevada após o procedimento 20.
Apesar da reconhecida importância e da freqüente participação da fisioterapia respiratória na assistência neonatal ainda são escassos os estudos que avaliam a eficácia e segurança das técnicas fisioterapêuticas no recém-nascido, conforme mostra a revisão sistemática de Flenady e Gray1, que pode incluir apenas três ensaios clínicos controlados envolvendo 138 recém-nascidos para avaliar os efeitos da fisioterapia respiratória na prevenção de morbidade em recém-nascidos, durante o desmame da ventilação mecânica. A conclusão desta revisão foi que embora a fisioterapia possa reduzir a necessidade de reintubação, os dados são insuficientes para que se possa determinar a eficácia e segurança deste procedimento, havendo necessidade de mais estudos.
Os resultados do presente estudo sugerem que o AFE pode ser aplicado com segurança em prematuros de muito baixo peso, estáveis e no período pós-extubação. Seu efeito a curto prazo na oxigenação equipara-se à FRC, tendo como vantagem a ausência de repercussão na freqüência cardíaca. Há necessidade de mais estudos para confirmar estes resultados iniciais, avaliar o efeito desta intervenção em outras situações como o uso de ventilação pulmonar mecânica, bem como investigar seu efeito em outros desfechos clínicos relevantes, tais como: quantidade de secreção eliminada, tempo de assistência ventilatória e/ou uso de oxigênio.

escrito por:Antunes LCO; Silva EG; Bocardo P; Daher DR; Faggiotto RD; Rugolo LMSS

fonte:http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-35552006000100013&script=sci_arttext

Cartão de visita